Al-Madan Online IIª série, n.º 22, Tomo 1, Janeiro 2018

 

EDITORIAL

 

A abrir, esta Al-Madan Online confronta-nos com uma séria ameaça à integridade e preservação de uma das jóias da Arqueologia portuguesa, justamente integrada na lista do Património Mundial da UNESCO: a arte rupestre do Vale do Coa, que em 1996 se livrou da submersão provocada pela construção de uma barragem, mas está desde então sujeita a cheias prolongadas. “As gravuras não sabem nadar” deu mote a um movimento que abalou a sociedade portuguesa nos já distantes anos 1990. Presumimos hoje que continuarão a não saber. Contudo, constatamos que boa parte delas teve de desenvolver entretanto uma invulgar aptidão para o mergulho em apneia!

Conhecidas as condições ambientais da região, é expectável que a acção dos agentes naturais aumente sazonalmente o caudal do rio Coa. Mas não é admissível permitir que esse efeito seja fortemente agravado pela ensecadeira que deveria ter funcionado só alguns meses, durante a construção da barragem, mas lá permanece quase 25 anos depois! É um enorme factor de risco para um Património único e insubstituível, e também uma severa condicionante à sua investigação, conservação e fruição pública. Identificar o problema e detalhar as suas causas e consequências tem o inegável mérito de alertar para a urgência de medidas correctivas que merecem a atenção imediata da DGPC e da Fundação Coa-Parque.

O Parque e o Museu do Coa justificam ainda outra abordagem nas páginas desta Al-Madan Online, onde é defendido um modelo alternativo de gestão patrimonial. É um dos textos de opinião, que também se ocupam da investigação do século VIII e do paradigma dos orçamentos participativos. Os artigos dedicados a trabalhos e estudos arqueológicos são diversificados, temática e cronologicamente, e tratam contextos e materiais que vão da romanidade ao século XIX: da villa romana de Fundo de Vila (Tábua) à rede viária dessa época na zona do Vimieiro (Arraiolos); das várias ocupações do Alto da Casa Branca (Lisboa) aos fornos de cal contemporâneos em Vila do Conde, Póvoa de Varzim e Trofa; de 1/4 de dirham almóada recolhido na zona de Alcácer do Sal, às gemas gravadas em alfaia litúrgica dos séculos XIV-XV e aos projécteis de armas ligeiras usados nos confrontos do século XIX. Há ainda um contributo para a história do ensino da Arqueologia em Portugal, a análise de fontes documentais relativas aos Paços do Município de Alcácer do Sal e à arte do guadameci em Évora e Vila Viçosa nos séculos XVI e XVII, e espaço para defender a tese que Fernão Lopes (≈1380/1390-1460) terá nascido e sido sepultado no Alandroal. Por fim, desenvolvido noticiário arqueológico antecede o comentário a diversos eventos e a agenda dos que são conhecidos para os próximos meses.

E para começar bem, tem já a seguir uma reflexão sobre o binómio Arqueologia - Turismo.

 

Votos de boa leitura!

 

Jorge Raposo [in Al-Madan Online, 22 (1): 3]

 

[voltar ao índice]