Al-Madan 2ª série, n.º 12, Dezembro 2003
EDITORIAL
O
papel do arqueólogo, do antropólogo, do historiador e de outros profissionais
das ciências sociais e humanas tem vindo, gradualmente, a adquirir contornos
mais precisos no âmbito dos estudos de incidência territorial, seja na avaliação
do impacto ambiental de pequenas e grandes obras, seja nos projectos de maior
escala, ligados à elaboração de instrumentos de gestão e política de solos.
Entre
estes, pelo facto de frequentemente suprirem a ausência de medidas de
ordenamento regional e nacional e pela sua íntima relação com a qualidade de
vida dos cidadãos, avultam os Planos Directores Municipais (PDM’s) que foram
paulatinamente cobrindo todo o território nacional.
De
1985 a 2003 completou-se a comummente denominada “1ª geração” destes
documentos, boa parte dos quais atingiu entretanto, ou está prestes a atingir,
o período normal de vigência (uma década), levando a que se desencadeie em vários
municípios o processo que conduzirá à sua substituição.
O
Centro de Arqueologia de Almada e o Geota – Grupo de Estudos de Ordenamento do
Território e Ambiente, materializando o protocolo que os une, consideraram
assim ser agora o momento oportuno para um balanço das condições de produção
dos PDM’s de “1ª geração”, convidando vários especialistas a expressar
o seu ponto de vista e a reflectir mais concretamente sobre a incorporação dos
elementos de interesse patrimonial nos modelos de desenvolvimento do território
e nas políticas de gestão do mesmo.
Para
além disso, procuraram ouvir o que sobre o assunto tem a dizer aquele que
muitos consideram o “pai” do ordenamento do território no nosso país, o
Arqt.º Gonçalo Ribeiro Telles, que não se fez rogado e respondeu às
perguntas colocadas com a frontalidade que o caracteriza, defendendo
coerentemente os princípios pelos quais se bate há décadas.
Outros
profissionais partilham também as suas experiências nesta matéria,
contribuindo para que se reúnam as perspectivas de abordagem multidisciplinar e
o cruzamento de discursos teóricos e metodológicos que sempre esteviveram
subjacentes ao projecto editorial que inicámos em 1982.
O
resultado fica à consideração dos leitores, que aqui encontrarão certamente
propostas e reflexões estimulantes e enriquecedoras do debate sobre a fase de
elaboração dos PDM’s de “2ª geração” em que se envolve já boa parte
dos municípios portugueses. E dificilmente poderemos alhear-nos de algo que
incide directamente na qualidade de vida de todos nós, transformando,
simultaneamente, em direito e dever do pleno exercício da cidadania democrática
a participação na definição das orientações estratégicas em que devem
assentar os modelos de desenvolvimento a nível local.
Só com sólida participação técnica e amplo envolvimento cívico se legitimarão opções políticas dirigidas a uma verdadeira gestão integrada do território, que valore a totalidade dos seus recursos e os integre com equilíbrio e ponderação nos processos de transformação social que marcam o nosso quotidiano. De outro modo, prevalecerão as práticas que a experiência há muito desaconselha e desenvolver-se-á a acção predatória dos múltiplos interesses que se empenham em fazer dos espaços que habitamos verdadeiros não-lugares, sem memórias individuais e sociais, deixando-nos num Presente com muito pouco Futuro.
Jorge Raposo [in p. 3]