Al-Madan Online 2.ª série, n.º 27, Tomo 1, Janeiro 2024

 

EDITORIAL

 

Na segunda metade da década de 1980, a identificação e escavação parcial da olaria do Porto dos Cacos, em Alcochete, contribuiu decisivamente para o conhecimento da socioeconomia da região estuarina do Tejo no período romano e na transição para a Antiguidade tardia, nomeadamente no que respeita à produção cerâmica para uso doméstico e, em particular, de contentores anfóricos destinados à "indústria" de transformação de pescado e à sua exportação em grande escala para o vasto território imperial entre os séculos I e V d.C.

Mais de três décadas depois, foi agora possível voltar ao sítio com as técnicas que a Geofísica aplicada à Arqueologia entretanto desenvolveu e, sem intrusão no subsolo, obter novos dados que reforçam o que podemos antever do enorme potencial científico e patrimonial aqui preservado, e confirmam as razões que justificaram a sua classificação como Sítio de Interesse Público e a delimitação de uma generosa Zona Especial de Protecção.

Aos três fornos revelados pela Arqueologia, a interpretação geomagnética junta pelo menos mais dez, o que torna o Porto dos Cacos um dos maiores centros oleiros de época romana que conhecemos no espaço hoje português. O tema é detalhado em artigo que preenche as primeiras páginas desta Al-Madan Online e se junta à já extensa bibliografia dedicada a um sítio a preservar, onde urge lançar as bases para a sua futura investigação, valorização e fruição pública.

Também merecem destaque nesta edição outras descobertas e intervenções arqueológicas em sítios e contextos de diferentes cronologias, da Pré-História à contemporaneidade, distribuídos pelo território continental e pelos mares dos Açores.

O mesmo sucede com os estudos de bens móveis, que recorrem tanto à epigrafia, à numismática e à toponímia, como à abordagem etnoarqueológica de produções cerâmicas, à interpretação de monumentos funerários ou à interligação da rede viária com as estratégias de povoamento.

No espaço de opinião é questionada a "indesejável dicotomia" entre a Arqueologia preventiva e a investigação académica, havendo ainda reflexões sobre a relação entre a Arqueologia, a Arte e o Património cultural material e imaterial.

A encerrar, notícias de actualidade arqueológica e da sua relação com outras áreas científicas, comentário a eventos recentes, agenda dos que se perspectivam para os próximos meses e destaque das novidades editoriais mais relevantes.

Mas a boa leitura pode começar já pela crónica de abertura, desta feita dedicada à sistematização de algumas sugestões para comunicar ciência "com peso, conta e medida".

Em suma, creio estarem reunidas as condições para que este seja mais um tomo prazeroso e estimulante, e expresso o voto de que possa ser fruído em segurança e com saúde.

 

Jorge Raposo, 26 de Janeiro de 2024 [in Al-Madan Online, 27 (1): 3]

 

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