Polémica a partir do texto
SOARES, António M. Monge (2005) – “Algumas Observações Sobre a Civitas de Pax Ivlia, ou de como, por vezes, não se deve confiar em levantamentos arqueológicos”. Al-Madan. IIª Série. 13: 86-88.
Espaço aberto aos principais protagonistas e a outros depoimentos que se considerem relevantes para o presente debate, em complemento do Fórum Al-Madan, acessível a todos os que queiram manifestar a sua opinião.
Em Resposta ao Prof. José d’Encarnação
Prof. José d’Encarnação:
Uma vez que teve a delicadeza de me questionar publicamente, enquanto Director da revista Al-Madan e responsável pelo seu tratamento editorial e gráfico, a consideração que de há anos tenho por si obrigar-me-ia necessariamente a uma curta resposta, que constitui também o esclarecimento devido aos leitores da revista e aos utilizadores do site que lhe está associado.
Vem a sua mensagem a propósito de artigo de opinião de António Monge Soares (AMS) publicado na última edição (n.º 13, 2005, pp. 86-88), onde este aborda alguma da informação arqueológica que sustenta a tese de doutoramento defendida por Maria Conceição Lopes na Universidade de Coimbra, entretanto editada.
No essencial, considera que, ao divulgar o referido artigo, Al-Madan “prestou um mau serviço ao autor da diatribe” e, até, “à Arqueologia nacional”, com a agravante de se ter colocado em destaque uma frase que em nada “honra” a edição.
Naturalmente, não me cumpre defender os autores das suas próprias opiniões, a que terão sempre direito no contexto de um modelo editorial que desde sempre procurou dedicar um espaço importante ao debate científico, deontológico ou sócio-profissional. Cumpre-me sim, com a colaboração e envolvimento (total ou parcial, de acordo com o procedimento colectivamente estabelecido) dos(as) colegas da Redacção e dos membros do Conselho Científico, avaliar se estas se enquadram nesse modelo e se respeitam as regras básicas de um diálogo sustentado, sério e ponderado, ainda que expressas com maior ou menor desassombro e envoltas na controvérsia que amiúde caracteriza as sociedades abertas e democráticas. Isto é, não procuramos a polémica, mas também não fugimos dela.
Foi o que sucedeu no caso em apreço, que não só se entendeu ser de evidente interesse público, mas também confinar-se nos limites aceitáveis dos critérios expostos.
Obviamente, assumo a responsabilidade última pela publicação do texto de AMS, tal como de todos os restantes materiais – de carácter científico, informativo ou opinativo –, que preenchem as páginas da Al-Madan (o que não quer dizer que partilhe a defesa do seu conteúdo), assim como assumo a natureza subjectiva da definição de fronteiras do tipo das que aqui tratamos, que transforma a opinião legítima de uns na afirmação abusiva de outros.
Mas também me honro de, desde que o primeiro número foi apresentado, em 1982 (já lá vão quase 25 anos!), nunca procurar distorcer esses limites para mover processos de intenção contra pessoas ou instituições. E também ninguém poderá acusar a Al-Madan de negar espaço para a defesa de quem se tenha sentido injustamente citado.
Aliás, a preocupação de garantir equidade de tratamento e a possibilidade de resposta em tempo útil por parte dos visados (comprometida numa edição em papel de periodicidade anual), esteve na base da criação de uma via electrónica mais expedita, através deste mesmo site e do Fórum que, em permanência, é colocado à disposição dos interessados. O que não invalida, ainda, que o tema possa vir a ser retomado em futura edição impressa, se surgirem textos mais estruturados que o justifiquem.
Num meio científico pequeno e, como todos sabemos, eivado de um certo “espírito de facção” que o subdivide em grupos ainda mais pequenos, frequentemente rivais, esta atitude de isenção e o esforço de criação de igualdade de oportunidades será, creio, uma das razões do sucesso e do prestígio entretanto acumulado pela Al-Madan. Com acidentes de percurso, é certo (porque o caminho se vai em parte traçando à medida que se caminha e porque a diferença de opiniões é indissociável da interacção social), mas justificando que, ao longo do tempo, tantas dezenas de autores, independentemente do seu “peso” pessoal, académico ou institucional, se sintam motivados a confiar nesta revista para editar o produto do seu trabalho.
Por fim, sinceramente não compreendo, até pela experiência jornalística que invoca, a crítica que faz à frase colocada em destaque no artigo de AMS. Como é norma deste tipo de citações (e é isso que sempre tenho procurado em casos similares), elas visam sintetizar as problemáticas, os objectivos e as conclusões dos autores, permitir aos leitores uma rápida apreensão da temática e da perspectiva de abordagem, e despertar o seu interesse para a leitura integral.
Neste caso concreto, quem ler o título e subtítulo e, depois, a referida citação, percebe imediatamente isso tudo: de que trata o autor, com que perspectiva e a que conclusão chega. Voltando a reler o texto, não encontro solução alternativa que melhor cumpra o objectivo da síntese jornalística, e isto é tanto mais verdade quanto, quer o Prof. Jorge de Alarcão, no texto que sobre o assunto subscreve na revista Conimbriga (ver. p. 316), quer o Prof. José d’Encarnação, no comentário que está disponível neste mesmo site (ver Das Opiniões em Arqueologia), quando querem sintetizar a posição de AMS, vão buscar precisamente o mesmo parágrafo! Vão buscá-lo para discordar fortemente do que nele se escreve (e estão no seu pleno direito), mas que editor consciente da sua responsabilidade de valorização dos originais que recebe e da mediação que lhe compete estabelecer com os leitores se coibiria de o utilizar? É uma frase contundente, é certo, mas seria editorialmente mais correcto “abafá-la” ou substitui-la por outra mais inócua e, por isso mesmo, menos esclarecedora? Nunca foi esse o caminho da Al-Madan.
Concluo disponível, como sempre, para dialogar sem preconceitos com quem, legitimamente, tenha outras formas de pensar as mesmas coisas, disponível a trabalhar para que a Al-Madan continue, entre outras coisas, a estimular debates que permitam criar hábitos de crítica e de convivência com a crítica, que tão necessários serão em todas as vertentes da actividade arqueológica em Portugal.
Almada, 28 de Novembro de 2005
Jorge Raposo